quarta-feira, 19 de agosto de 2009

DEPOIMENTO DA MÃE DO MARTIM SANTOS

Desde as 11 semanas de gestação da gravidez do Martim que comecei com hemorragias, fiquei de repouso mas na iminência de perder, o tão desejado, segundo filho. Entre vários internamentos e montes de ecografias, aguentei até às 29 semanas. Já estava sem líquido amniótico e tiveram de me fazer uma cesariana. O Martim nasceu com 1.200KG.
Quando “despertei” da cesariana, tinha o meu marido ao meu lado e sentia-me ansiosa em saber como estava o bebé, se tinha sido necessário ser ventilado e todas aquelas situações que me apercebi enquanto tinha estado internada, que os prematuros estariam sujeitos.
Sentia o meu marido muito triste e preocupado e disse-me que logo que eu me sentisse com forças iríamos os dois ver o bebé, pois ele tinha um problema de pele…
Fiquei confusa e muito preocupada por vê-lo tão angustiado e a muito custo subi ao terceiro piso para ver o meu filho. Nunca tinha entrado em nenhum serviço de Neonatologia. Era só máquinas a apitar e eu não sabia em qual delas estaria o meu filho. Uma enfermeira encaminhou-me para uma incubadora e enquanto caminhava-mos, alertou-me que aguardavam a chegada de um médico do Curry Cabral para avaliar o problema de pele com que o bebé tinha nascido. Quando olhei para dentro da incubadora, o mundo desabou aos meus pés. Por uns momentos senti-me como se tivesse a ter um pesadelo. Era uma coisa mínima todo enrolado numa gase branca só com a cara descoberta a deixar ver um tom de pele que não era identifico a nada! Era castanho, os olhos nem se percebiam estavam todos revirados. Tentei observar melhor para perceber se alguma coisa se assemelhava a um bebé dito normal. Pedi para sair imediatamente da sala pois não me estava a sentir bem. Vim para o quarto e chorei desesperadamente. Não percebi o que me estava a acontecer. Não era aquele filho que eu desejava, não era aquele irmão que eu queria dar à minha filha.
À tarde voltei a ir ao 3º piso e desta vez com alguma força para perceber o que se passava. O médico já tinha estado lá e tinham-lhe tirado toda aquela gase gorda. O prognóstico era uma ictiose. Explicaram-me que tipo de doença era, as possíveis variantes da mesma e mais informação que a minha cabeça não conseguiu captar. Apercebi-me de que se tratava de uma doença sem cura e que nalguns casos seria bastante grave e muito mais num bebé prematuro. Começei a sentir nessa mesma tarde a minha responsabilidade de mãe, no sentido de o ajudar a vencer todos os obstáculos que viessem pela frente.
Nasceu em mim uma enorme vontade de sentir a pele dele ao toque e pedi para que me deixassem abrir a incubadora e tocar-lhe. Assim o fizeram e dei por mim, não a tocar-lhe, mas sim a acariciá-lo. A pele era seca e áspera, então eu procurei as zonas mais macias para não sentir impressão. Esse momento foi fantástico, foi tipo um íman… eu não queria deixa-lo ali sozinho e desaconchegado do colinho dos pais de que qualquer bebé precisa. O Martim foi melhorando e toda aquela pele castanha foi estalando e aparecendo uma pele de cor normal. Sempre com bastante hidratação e muitos cuidados no tipo de roupa que usava fomos aprendendo a lidar com as necessidades e imposições que a doença nos impunha.
Hoje o Martim tem 10 anos, o tratamento dele é creme hidratante de manhã e à noite (dexeril), por vezes já é ele que o coloca, muito embora as mãos do pai e da mãe conseguem hidratar muito melhor… Diz que é uma seca por creme e sempre que usa um creme novo tem curiosidade em perceber se lhe deixa um cheiro agradável. (O que por vezes é difícil)
Está numa idade em que não lida muito bem com alguns comentários que pessoas estranhas lhe dizem relativamente ao aspecto da sua pele e foi isso que me levou a procurar pessoas com a mesma doença. Muito embora uma ictiose vulgar é menos agressiva do que uma ictiose lamelar por exemplo, ele sente que a pele dele é diferente em relação à da irmã ou dos seus amigos. Portanto foi bom ele conhecer pessoas como ele e partilharem experiencias e sentimentos que só eles o podem perceber.
É uma criança extremamente extrovertida, alegre e bem-disposta. É muito ligado à mãe, sabe-se lá porquê? … o dito íman nunca mais se descolou entre nós.
Sandra Santos

5 comentários:

  1. Sandra, nem sei como comentar, mas vieram-me as lágrimas aos olhos.
    Eu não sei como foi a reacção da minha pobre mãe, lá em Angola.
    Mas olha, Sandra, como vês tenho sido um lutador e faço ver a muita gente.
    Fantástica a tua descrição.
    Um grande beijinho para ti, um abraço ao teu marido e um GANDA APERTÃO DE PEITO a esse ilustre Martin.

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  2. Irmã...Apesar de ter acompanhado todo o processo e de eu pópria ter sentido "o mundo a desabar quando vi o Martim pela primeira vez", foi especialmente comovente ler o teu testemunho e perceber como é que as coisas realmente se passaram "dentro de ti". Foi um momento muito dificil, mas vocês têm sido uns pais espectaculares. E é tambem graças a essa força, dedicação e zelo, que o Martim é hoje um menino tão feliz e saudável! E aquilo que outrora foi um choque e um desgosto enorme, tornou-se um mal menor, que não impede este puto de crescer, rir e viver! E tão bem que ele o sabe fazer...:)
    Beijos e adoro-vos
    Tia Marta

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  3. Parabéns a todos os "heróis" deste blog pela sua coragem e vontade de viver! Já conheci alguns de vós e confesso que para mim, foi uma lição de vida...O que eu vos admiro!!!
    Que este "sítio" sirva para inspirar outros tantos que ainda não descobriram essa coragem dentro de si e perceberem que "por morrer uma andorinha não se acaba a primavera"...
    Todos juntos serão ainda mais fortes, portanto boa sorte para o blog e felicidades!

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  4. Oi mãe do martim parabéns foste uma super mulher ....
    Nunca deixe de amar o teu pequeno herói...
    bjs

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  5. Eu chorei lendo o seu comentário me fez lembrar a minha irmã que era a mãe do joão que tambem
    tem ictiose lamelar congénita.

    um beijinho para si,

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